
Motricidade Humana
O professor universitário, filósofo, autor de várias obras sobre desporto e ex-deputado da Assembleia da República faleceu na quarta-feira dia 19 de fevereiro, em Lisboa, aos 91 anos. Manuel Sérgio nasceu a 20 de abril de 1933, em Lisboa. Licenciou-se em Filosofia pela Universidade Clássica de Lisboa e foi professor catedrático convidado da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa, professor catedrático da Universidade Fernando Pessoa e do Instituto Superior da Maia, bem da Faculdade de Educação de Física da Universidade Estadual de Campinas, no Brasil.
É curioso que na semana anterior à notícia do falecimento de Manuel Sérgio recebi em casa três livros que me despertaram particular interesse e um quarto que já encomendei:
Manuel Sérgio, 01-2024: “Desporto é Dizer Transcendência”, Edições Afrontamento.
Manuel Sérgio, 11-2019: “Da Ciência à Transcendência, Epistemologia da motricidade humana”, UCP Editora.
Manuel Sérgio, 08-2023: “Filosofia do Futebol”, Cultura Editora.
Manuel Sérgio, 01-2022: “Uma Reformulação da Ética e Outros Escritos”, Edições Afrontamento.
Além de todos os aspetos abordados na obra de Manuel Sérgio, as palavras “Transcendência” e “Ética” assumem particular relevo e, na minha opinião, introduzem algo de bastante pertinente para a abordagem no campo da Motricidade Humana. Falaremos mais à frente destes dois conceitos.
Como é largamente sabido, a rede-Motricidade-Humana, para além de procurar inspiração nas palavras de Manuel Sérgio, propõem abordagens pedagógicas e didáticas alternativas que enriquecem a praxis pedagógica dos Professores de EF e que traduzam este Novo Paradigma da EF. Porém, ao contrário de Manuel Sérgio e outros académicos de relevo na Cultura Física Nacional, que “nunca pisaram o chão da escola” (Não foram Professores de EF) e têm uma visão de cima-para-baixo sobre a Educação Física, os promotores da redeMH, partem de uma visão de baixo-para-cima. Isto quer dizer que, mais do que uma visão teórica (mesmo que, bem fundamentada e refletida) da EF, procuram tornar práticas e exequíveis as ideias de notáveis académicos, introduzindo elementos inovadores e descartando tudo o que não se consegue operacionalizar ou perde sentido quando se está perante um grupo de alunos numa escola, com uma cultura e realidade muito específica. Os Professores de EF, mais do que meros replicadores das ideias e conceitos de ilustres pensadores como Manuel Sérgio, devem ter espaço para a divergência pedagógica, autonomia, criatividade e Sabedoria Prática, porque são eles que estão em contacto com o público e sentem o que é mais adequado para cada contexto e público alvo (Valorização da Inteligência Cultural).
O ensinar é pessoal e experiencial – a este tipo de conhecimento Aristóteles designou por Fronese. Esta visão de conhecimento baseia-se na ideia de que as idiossincrasias pessoais podem ser prolíficas e em última instância, inevitáveis. A Fronese não pode ser aprendida nos manuais ou no contexto académico e depois transferida para as situações reais. A Fronese relaciona-se com a experiência e pelo facto de ser experiência pode ser partilhada abrindo caminho para algo novo. Atualmente a Fronese recebe o nome de Sabedoria Prática, nous (palavra utilizada para descrever uma forma de perceção que opera dentro da mente, o “olho da mente” e não apenas através dos sentidos), prudência (vislumbre, sabedoria, conhecimento), etc… A Fronese apresenta uma dimensão ética porque um Professor com verdadeira experiência, pratica a Consciência Social Plena (Mindfullness Social).
A Sabedoria Prática, segundo Barry Schwartz no seu livro Practical Wisdom, the right way to do the right Thing, define-se como a vontade de fazer o que está certo e a capacidade de distinguir o que está correto do ponto de vista moral e ético.
Quando se acredita na normalização e homogeneização das soluções pedagógicas para todos os alunos, de Norte a Sul do País (“Um Tamanho Serve para Todos”) cai-se no erro da Burocratização da Escola e da Educação Física, cultiva-se a mediocridade e não se valoriza a Sabedoria Prática (Fronese) dos Professores, porque se privilegia o “aluno médio” (uma figura inexistente) e destrói-se o talento. E como diz Roberto Carneiro, as Escolas não devem ser os Terminais Burocráticos do Estado e para incorporar o paradigma pós-moderno do conhecimento polissémico no sistema educativo, será preciso resgatar a escola das garras burocráticas do Estado. E isto faz-se restituindo a escola às suas comunidades locais de pertença. Desmonopolizar a educação é condição da sua desmassificação. (...) O Estado deve definir os Programas Mínimos. Roberto Carneiro defende que os programas de Ensino devem ter três componentes:
Uma componente Nacional - 20%.
Uma componente regional - 30%
Uma Componente Local - 50%.

Na minha opinião, apenas deveremos ter duas componentes:
Uma Componente Nacional (linhas orientadoras gerais - Finalidades) - 20%.
Uma Componente Local (Comunidades Educativas Locais) - 80% (Inteligência Cultural e Sabedoria Prática).
Os Programas Nacionais agora chamados de Aprendizagens Essenciais, não precisam de ter mais orientações que estas 4 Finalidades, as 4 Dimensões da AFLV e o PASEO (Perfil do Aluno). Cabe às Comunidades Educativas operacionalizar os currículos seguindo estas orientações e definir o que é Essencial.

As 4 dimensões da Atividade Física ao Longo da Vida (AFLV)


Projeto de Educação Física de Agrupamento de Escolas ou Escola Não Agrupada.
Projeto de Educação Física de Turma.
Projeto de Saúde e Bem-Estar Integral - Avaliação do Estilo de Vida de cada aluno e prescrição individualizada.
Afirma Roberto Carneiro no seu livro Fundamentos da Educação e da Aprendizagem - A Educação é o grande instrumento de Liberdade e de Autonomia, que este é o caminho da diversidade, do pluralismo e da flexibilidade e não do monolitismo nem da permanência do peso de um enorme centralismo jacobino.
Burocratização da EF:
Quando as coisas correm mal temos tendência para adotar duas estratégias:
Criar mais Regras (Guiões, Programas, AEEF).
Introduzir Incentivos.
Mas o problema de confiar em regras (paus) e incentivos (cenouras) é que elas desmoralizam a atividade profissional em dois sentidos:
Primeiro, desmoralizam as pessoas (PEF) que estão empenhadas na atividade porque lhes retira espaço para a Fronese, Sabedoria Prática.
Em segundo lugar, desmoralizam a própria atividade (EF). A própria prática é desmoralizada, e os praticantes (Professores e Alunos) são desmoralizados. Quando se manipulam os incentivos (cenouras: avaliação dos professores e dos alunos) para que as pessoas façam a coisa certa, criam-se pessoas que são viciadas nos incentivos.
Criamos mais e mais regras (Estandardização das qualificações; Homogeneidade das AEEF, Provas de Aferição; Testes de Aptidão Física) para garantir que até os professores menos interessados e/ou diligentes no cumprimento da sua obrigação profissional, se as seguirem e cumprirem, asseguram que os alunos aprendem as competências chave, beneficiam com a prática regular do exercício físico e jogos, tornam-se fisicamente literadas e desenvolvem o gosto e motivação para prática do exercício físico ao longo da vida (Lógica Técnica e Produção). Esta normalização da EF centrada nas matérias nucleares, facilita a muitos PEF um certo grau de conforto e segurança na realização da sua profissão porque não os obriga a pensar, basta seguir as normas prescritivas e guiões baseados nas AEEF e as progressões de aprendizagem apresentadas nos manuais – “Uma-medida-Serve-para-Todos” (“Mito da Média”) – O Mito do aluno Médio e o Mito do Professor Médio. Criamos desta forma uma Burocracia Profissional onde a rotulagem académica (e moral) dos alunos serve este objetivo. Aliás, vários estudos têm posto a descoberto as limitações e constrangimentos que condicionam a ação dos professores ao nível da sala de aula (Espaços Desportivos), questionando mesmo sobre o caráter “profissional” das opções e decisões que sistematicamente têm de tomar. Trata-se do primado da burocracia administrativa sobre a pedagogia. Esta tentação de tudo controlar e de tudo prescrever tem sido particularmente comum nos estabelecimentos de ensino onde a administração central (Tecnoestrutura) através de uma parafernália de normativos (decretos-Lei, portarias, despachos, circulares, etc), procura programar ao pormenor o trabalho da escola e do professor, desde as questões mais expressivas aos aspetos mais instrumentais.
No entanto, não existe nenhum conjunto de regras, por mais específicas que sejam, por mais cuidadosamente controladas e reforçadas que sejam que nos deem o que precisamos. O que precisamos desesperadamente, para além de melhores regras (Paus), e de incentivos razoavelmente inteligentes (Cenouras), é de virtude, precisamos de carácter, precisamos de pessoas que queiram fazer a coisa certa. Em particular, a virtude de que mais precisamos, é a virtude a que Aristóteles chamou Sabedoria Prática.
Sabedoria Prática é a vontade moral de fazer o que está certo e a capacidade moral de distinguir o que está correto do ponto de vista moral e ético (Praxis). Lidar com outras pessoas requer um tipo de flexibilidade que nenhum conjunto de regras (Paus) consegue alcançar. As pessoas sábias sabem quando e como dar a volta às regras (“Régua Flexível”). As pessoas sábias sabem como improvisar.
Demorei 10 anos para perceber que a EF que praticava apresentava imensas limitações e lacunas. Manuel Sérgio abriu o caminho ao afirmar aquilo que eu havia constatado mas não sabia expressar na altura, "a expressão Educação Física é atualmente uma expressão limitadora, estática e não válida" (Manuel Sérgio, Motricidade Humana, uma nova ciência do homem, UTL-ISEF)..
Limitadora: "O paradigma emergente, ou holístico, colocou novas questões à EF, gerou crise no seio mesmo da ciência normal"
Estática: "a EF é a pré-ciência da Ciência da Motricidade Humana".
Não Válida: "E estar em crise, é anunciar o novo e, simultaneamente, denunciar o conservadorismo, o dogmatismo da ciência normal".
Manuel Sérgio afirmou no ciclo de Conferências organizado pela Associação de Estudantes em colaboração com o Departamento de Ciências do Comportamento Motor em 1989 (Motricidade Humana, uma Nova Ciência do Homem) que "O licenciado (ou mestre, ou doutor) em motricidade humana é assim o agente do ensino, ou o investigador, ou o técnico que, no exercício da sua profissão, procura a libertação dos corpos, rumo à transcendência, rumo ao possível (...)".
Estas foram algumas das perguntas que me assaltaram na segunda fase da minha carreira, onde eu pude experimentar uma crise de identidade comigo próprio e com a profissão que desempenhava! Senti necessidade de me recriar, de me transformar, transcender!...
De que forma, eu, um professor de Educação Física consigo , no exercício da minha profissão, libertar os corpos dos alunos, rumo à Transcendência?
Porquê, libertar os corpos? estarão eles prisioneiros? e de quê?
Transcender, o quê?, Como? e porquê?
Como Profissional de Educação Física e Desporto recém Licenciado não tinha grande alternativa na forma como lecionava porque tinha sido completamente doutrinado na ideologia do desporto que imperava já nessa altura no ISEF e depois FMH (vivi a transição de designação e do currículo). Durante a minha formação fui introduzido ao atual conhecimento sobre o Conteúdo Pedagógico da Educação Física oriundo do trabalho de Daryl Siedentop que era seguido pelos professores da FMH. Daryl Siedentop (1982) propôs um currículo e modelo de instrução que simulava aspetos contextuais chave do desporto no contexto da Educação Física. Argumentava que o desporto apenas podia ser visto como uma matéria da EF se esta situação fosse remediada, e as experiências dos alunos no desporto, fossem ricas do ponto de vista educativo e contextualizadas dentro da sua compreensão da cultura desportiva contemporânea. A designação deste Modelo Curricular designava-se por Educação Desportiva (atualmente escutamos o termo literacia desportiva) e representou a génese da inovação curricular na EF que subsequentemente proliferou por todo o globo inclusivé em Portugal. Obviamente que os programas de Educação Física transpareceram claramente esta total vinculação ao modelo desportivo bastante criticado por Jean LeBoulch cuja posição foi totalmente desvalorizada pela equipa dos programas de Educação Física. Num artigo publicado em 1988 no volume V, n.º 25 da Revista Horizonte intitulado "Caracterização da EF como Projeto Educativo", da autoria de Francisco Carreira da Costa, Carlos Januário, Alves Dinis, Luís Bom, João Jacinto e Marcos Onofre, falam da evolução dos objetivos e conteúdos da EF em relação ao desporto. Apresentam cinco referenciais axiológicos. Referem que a quarta corrente que assume uma escassa vinculação ou recusa do desporto (Psicocinética, psicomotricidade e sociomotricidade) era muito polémica desde a sua génese e baseava-se nos avanços da neuro-fisiologia e enfatizava os mecanismos percetivos da conduta motora. A importância desta orientação residia no facto de, com ela, o indivíduo aprenderia a aprender, tornar-se-ia disponível, capaz de aprender qualquer atividade. Por esta razão, a aprendizagem de um movimento desportivo em si, não tem razão de ser - tanto pode ser esse como outro qualquer. O movimento operacionalizado e difundido principalmente por Jean LeBoulch e seus seguidores surge como uma indiferença ou mesmo recusa ao desporto.
Na segunda década da minha carreira como professor de Educação Física comecei a investigar esta quarta corrente que me pareceu muito mais interessante, apelativa e importante aplicar nas aulas de Educação Física. Questionei-me na altura sobre o motivo que levou os criadores dos PEF (Programas de Educação Física) a optar pelo segundo e terceiro referenciais axiológicos como alicerces para a sua construção:
Vinculação Total ao Desporto: desporto na escola como meio de formação "integral(?)".
Vinculação Instrumental ao Desporto: Trabalho sistemático da Condição Física.
Manuel Sérgio tece várias críticas à EF e distingue esquemas motores de padrões de movimento: "não acredito em padrões de movimento, pois tanto teria que acreditar também na padronização do mundo". E de facto apercebi-me que a desportivização da Educação Física refletia exatamente uma padronização do movimento imposta pelos gestos técnicos desportivos. Como afirma Jean LeBoulch no seu livro "Rumo a uma ciência do Movimento Humano" quando fala do corpo-instrumento e a EF, refere que o caráter analítico da progressão dos exercícios é um dos aspetos característicos dos métodos mecaniscistas que visam criar estereotipos estáveis de atitude (Gestos Técnicos = automatismo). (...) Atualmente a EF confunde-se quase exatamente com a iniciação à prática competitiva e seu corolário, a aprendizagem de gestos específicos". A mecanização estrita ou o "drill" é um modo de aprendizagem responsável pela estereotipia gestual. A técnica do "drill" consiste em decompor os atos que vão ser aprendidos e a recompo-los numa gama de reflexos. Quando os músculos adotam o movimento e se libertam da tutela da mente, então o gesto fica automático.
Foi então que também descobri as reflexões de Jurjo Torres Santomé no seu pequeno mas muito importante livro intitulado "O Currículo oculto". Tomei consciência dos valores que transmitia de forma subtil e inconsciente através da minha praxis pedagógica. Crente na minha missão de professor de EF que foi programado para acreditar que através do desporto estava a contribuir para o desenvolvimento integral dos corpos dos alunos e para a sua saúde e bem-estar. Porém descobri que por trás da minha prática pedagógica estava uma ideologia. O sistema educativo costuma ser pensado a partir de determinada imagem de como são os meninos e as meninas, como se desenvolvem, etc., de tal forma que todos os alunos e alunas que apresentarem uma conduta que não esteja de acordo com as do modelo vão ser marginalizados, segregados. O currículo oculto poderia ser visto como algo relativamente benigno ou não muito negativo. Na realidade, esta dimensão implícita não teria outra missão senão a de conseguir uma continuidade das normas e valores dominantes tal como são definidos e defendidos pelos grupos sociais que têm mais poder na sociedade adulta e, deste modo a ordem social consegue manter-se inalterável. A minha descoberta desta dimensão profunda do currículo oculto assumiu particular relevância porque me permitiu captar o significado de práticas e hábitos que até ao momento vinham passando despercebidos, sobretudo o seu impacto nos alunos.
A cultura encontra-se, portanto, dominada pelos interesses de classe (Associações de professores de EF e a sua visão da EF). Esta teoria considera que as divisões em classes e grupos sociais, e as configurações ideológicas e materiais sobre as quais elas se apoiam, são transmitidas e reproduzidas através da violência simbólica. Ou seja, quando o poder detido por uma classe social é utilizado para impor uma definição de mundo, para definir significados e apresentá-los como legítimos, dissimulando o poder que tem para o fazer, escondendo além disso, que essa interpretação da realidade coincide com os seus próprios interesses de classe. Assim, esta violência simbólica reforça com o seu próprio poder as relações de poder nas quais ela se apoia, e contribui dessa forma, para a "domesticação do dominado". Os CNEF (Congressos Nacionais de EF) são um instrumento de promoção de uma interpretação da Educação Física que Manuel Sérgio afirma ser um caso de anacronismo.
Ao acreditar e personificar esta visão de EF exerci uma violência simbólica sobre os meus alunos através da minha ação pedagógica e por isso surgem conflitos dentro da sala de aula, porque muitos deles resistem à colonização do seu corpo e mente através das minhas opções curriculares e deste currículo oculto próprio das experiências MDEE (Mecânica, Dinâmica, Estética e Ética).
Este foi um dos grandes motivos pelos quais procurei desformalizar as práticas corporais e permitir diferentes experiências motoras. Jurjo Torres Santomé cita P. Bourdieu e J.-C. Passeron que declaram de forma explícita que toda a ação pedagógica é objetivamente uma violência simbólica enquanto imposição, por um poder arbitrário, de uma arbitrariedade cultural. Desta forma, se a ação pedagógica quiser ter êxito na distribuição do capital cultural terá de recorrer à autoridade pedagógica. O meu trabalho pedagógico contribuiu para dar referências sobre como deve ser interpretada a realidade, definindo itinerários, formas e métodos de resolver problemas que se colocam aos alunos para os programar para o mesmo habitus. Porém, desta forma não estava a contribuir para libertar os seus corpos para a transcendência!... Daqui, cada vez mais se materializou uma necessidade para a divergência pedagógica que resultou em alguns conflitos com outros Professores que não tinham a mesma visão e entendiam as minhas práticas como "heréticas" porque punham em causa o status quo, a norma. Desta forma, sem ter essa intenção, criei atritos na relação profissional por causa desta necessidade de criar rotura, de transcender este modelo de EF. Porém, o conflito que por vezes ocorre entre os indivíduos e a organização decorre de uma incorreta compreensão da natureza humana.
Uma das ideias centrais dos modelos subjetivos das estruturas é a negação da organização como uma realidade objetiva exterior ao sujeito que a experiencia, (...) admitindo-se que hajam tantas organizações quantos os participantes. (...) Daqui decorre que duas pessoas que trabalham na mesma escola podem mesmo funcionar em duas instituições irreconhecíveis. Os modelos democráticos defendem que as organizações existem não apenas para cumprir objetivos formais mas também para servir as necessidades das pessoas. Quando a organização é bem sucedida na satisfação das necessidades dos seus membros ambos beneficiam, afirma Virgínio Sá em "Racionalidades e práticas na gestão pedagógica - o caso do diretor de turma". As organizações apenas existem através da experiência pessoal de cada um dos seus membros. Daqui decorre que o significado atribuído às estruturas ou aos factos organizacionais varia não apenas entre diferentes indivíduos mas também "dentro" do mesmo indivíduo.
Também não devemos esquecer que existem muitos alunos cuja passagem pela Escola no geral e na EF em particular se pauta pela teatralidade. Aparentemente, interessa-lhes os conteúdos que o Professor de EF apresenta, procuram comportar-se com respeito pelas normas cuja transgressão é objeto de sanção, mas não acreditam em nada do que ali se lhes diz, desejam apenas passar pelo sistema educativo sem arranjar problemas. É claro que, nesta comunidade estudantil, o habitus não chega a criar-se, uma vez que esse corpo de alunos não aceita a cultura desportiva que lhe é oferecida e, por conseguinte, também não são desenvolvidos os processos de interiorização convenientes, nem se chega a manifestar neles, na forma de hábitos, o conjunto de necessidades, competências, formas de pensar, etc, que o sistema de ensino e o professor pretendia. Qualquer docente sabe também que existem nas salas de aula estudantes capazes de se oporem explicitamente aos conteúdos e valores que a instituição EF/escola defende. Estudantes politizados numa linha antagónica àquela que o sistema educativo oficial vende e que não se incomodam com as sanções com que pretendem atemorizá-los. São estes dois perfis que me fizeram questionar também a validade da minha prática pedagógica, por um lado o pouco impacto das aulas no seu conhecimento motor sobre as matérias desportivas no final de um ciclo de estudos e por outro, os alunos desafiadores, confrontadores.
Podemos colocar uma questão perfeitamente legítima:
Porque motivo, quando analisamos as preferências da população portuguesa quanto a diferentes tipos de práticas de atividade física, por faixa etária, nos apercebemos que os desportos que ensinamos na escola, não têm expressão estatística significativa?

Este foi um dos aspetos que critiquei ao me aperceber da "grande seca" que os alunos sentiam quando eram colocados em fila para realizar um exercício critério, em slalom, driblando uma bola de basquetebol com mudanças de mão e direção, correr para o cesto em drible de progressão e realizar um lançamento na passada. E mais chato ainda, quando os alunos em fila, se dirigem em corrida na direção do professor, que segura a bola na mão a 3 metros do cesto, para que interiorizem que no momento de agarrar a bola, devem ter o pé direito em contacto com o solo. Isto não é educar, é adestramento como afirma Olivier Reboul "O que é aprender?". O adestramento é um constrangimento exterior que impõe ao sujeito a aquisição de algumas condutas sem que faça apelo à sua iniciativa e recusa tomar em conta os gostos, desejos e as aspirações do indivíduo. O resultado é um automatismo cego. Os alunos aproximam-se, agarram a bola com as duas mãos, garantindo que o seu pé direito está em contacto com o solo nesse momento, realizando mais um apoio com impulsão e lançando a bola ao cesto. Os alunos questionam-me sistematicamente com um ar complacente "quando é que vamos jogar?".
Comecei a ignorar o lançamento na passada e a ensinar o jogo pelo jogo. Os alunos não precisam de saber fazer um lançamento na passada para jogar e encestar. Esta foi só uma das inúmeras constatações que fiz ao longo da minha carreira. Descartar o supérfluo e centrar-me no essencial da Literacia Física, no prazer e sobretudo na resolução de conflitos que surgem durante o jogo de oposição porque prevalece a interdependência negativa. Senti-me compelido a investigar sobre a Literacia Emocional e as Competências Sócio-Emocionais que comecei a implementar de forma suave. Porém, vários alunos, já formatados por este modelo da separação e fragmentação dos conhecimento e competências questionaram-me: "mas o professor não é psicólogo, não temos nada que falar de coisas pessoais!". Confesso que fiquei irritado porque existe uma grande diferença entre psicologia clínica e literacia emocional. Obviamente que os alunos são vítimas deste modelo de ensino fragmentado que procura remendar esta mesma desagregação com planos de Articulação curricular o que se torna em mais um peso burocrático. Um exemplo da abordagem da literacia emocional acontece no círculo de espírito do Frisbee.
O Ultimate Frisbee (UF) é o único desporto auto-referenciado no mundo e pode ser jogado por equipas mistas, algo que o desporto coletivo irá fomentar cada vez mais no futuro. (…) O UF (Ultimate Frisbee) pode ajudar os professores de EF à medida que ensinam as suas aulas e procuram uma estratégia que promova um compromisso com a comunicação e as normas ligadas ao Espírito do Jogo (SOTG – spirit of the game). Isto permite facilitar a formação de uma cultura única sustentada pelos intervenientes (Amoroso et al., 2021). Griggs, (2011) apresenta o UF como um desporto de autocorreção, que por sua vez resulta num melhor cumprimento das regras formais do jogo. Concluímos que esta perspetiva de auto-arbitragem poderá ajudar as crianças e jovens a estarem mais conscientes das suas ações, a melhorar o espírito de jogo e cria uma imagem positiva ao nível do desenvolvimento individual e de equipa, promovendo a integridade e os valores nas aulas de EF e ao nível do treino.
Manuel Sérgio apresentou inúmeras afirmações que me iam ajudando a refletir, no entanto, faltavam-lhe orientações pedagógicas operacionalizáveis para uma praxis pedagógica no campo da motricidade humana. As pistas estavam lançadas e eu segui muitas delas procurando soluções práticas para os desafios propostos.
Uma das descobertas que fiz foi o Parkour que me levou às suas raízes, o Método de Treino Natural de Georges Hébert.
Numa primeira fase comecei por introduzir nas aulas de ginástica, elementos do parkour. Ou seja, em vez de utilizar o plinto para realizar os elementos gímnicos tradicionais, utilizei-os como obstáculos ("muros"), desafiando os alunos a transpo-los, desconstruindo o formalismo da ginástica. Uma das formas de transposição é o King-Kong que em ginástica se chama "salto entre-mãos". Também desconstrui a formalidade do rolamento de ginástica e introduzi o "Zempo-Kaiten-Ukemi" (Ukemi-Waza" - técnica de amortecimento de queda) ou rolamento à frente que facilita a dissipação da energia depois de uma receção ao solo.
Numa segunda fase criei um Clube Escolar de Parkour, primeiro na Escola Secundária D. Inês de Castro onde comecei a utilizar pneus como materiais didáticos para criar obstáculos. O parkour é uma disciplina que afeta a identidade e a perceção do indivíduo porque se assume como um modelo de autoexpressão, cujo valor fundamental é “Transformar obstáculos em oportunidades” e este princípio determina que os praticantes reinterpretam os constrangimentos ou obstáculos sem os removerem, utilizando os espaços de forma personalizada e criativa. O parkour, devido às suas características tornou-se uma expressão popular da cultura juvenil que explora a plasticidade dos corpos e dos edifícios. E foi exatamente esta desconstrução do formalismo do movimento e a sua liberdade que me cativou por contrastar com o formalismo da técnica desportiva.
Numa terceira fase, não só introduzi o parkour como forma de trabalhar a aptidão física (circuitos) como adaptei as aulas de ginástica e também fundamentei um projeto na Escola Básica Fernando Casimiro Pereira da Silva intitulado "(Re)Animar Pneus, as Emoções na Aprendizagem - Projeto parque de parkour na Escola". A escola candidatou-se ao Prémio Inov.ação que tinha como objetivo premiar grandes "ideias verdes", novos serviços, produtos ou tecnologias relacionadas com os pneus usados ou materiais derivados da sua reciclagem. O Jurí era composto por pessoas de reconhecido mérito do meio empresarial, artístico/ cultural e académico, entidades públicas relacionadas com o ambiente e do sistema científico. O Projeto foi premiado e a escola recebeu o Prémio do melhor projeto tendo recebido 5.000€. A Escola, na pessoa do seu Diretor, Paulo Almeida, rapidamente negociou com a Câmara Municipal de Rio Maior a construção do parque de Parkour num espaço que foi requalificado para o efeito. Os nossos corpos desenvolvem uma resposta somática e afetiva (emocional) relativamente aos espaços arquitetónicos, e esta resposta surge em função do acoplamento mente/cérebro/corpo/edifício que corresponde ao tempo e espaço da habitabilidade do edifício escolar. Se as escolas são espaços de enclausuramento e os alunos são simultaneamente incluídos e excluídos através de determinadas práticas corporais espaciais, devemos interrogar a estrutura material do edifício em si como um local de contestação da identidade. Os aspetos do espaço estão fortemente ligados à identidade porque definem quem tem o direito de ocupar um determinado espaço ou quem pode estar desenquadrado (fora do seu lugar). A investigação nesta área pode transformar tanto as práticas da arquitetura das escolas e as práticas de ocupação destes edifícios. Se a arquitetura organiza, hierarquiza e sistematiza as nossas atividades, e se muito do nosso comportamento é definido como desviante relativamente à forma como nos recusamos, então parece ser urgente redefinir os espaços para que o ambiente dos edifícios defina uma participação legítima de todos, que seja inclusiva e dialógica. O parque de parkour surge como resultado desta reflexão, desta necessidade de devolver às crianças e jovens os espaços da escola com funcionalidades que lhes permitam realizar determinadas necessidades básicas tais como o brincar, o interagir socialmente e emocionalmente com os seus corpos, com os outros e com os espaços que as rodeiam. Tal como outros edifícios, as escolas são produtos do comportamento social.


Entretanto também desenvolvi o Projeto "Personal Training na Educação Física" que tinha como objetivo transferir para os alunos o conhecimento essencial para construir planos de treino de Aptidão Física. Este projeto contou com a minha experiência de 12 anos no ramo do Fitness, entre 1995 e 2007, altura em que assumi a responsabilidade de Diretor Executivo e Técnico do Ginásio Equilíbrio na minha área de residência.
Ao mesmo tempo que implementava o "Personal Training" também procurava soluções para desconstruir o formalismo dos jogos desportivos coletivos uma vez que queria criar jogos que promovessem uma moralidade superior. Foi nesta altura que surgiu a ideia de criar o Projeto "Game Designer":
Numa primeira fase propunha "Jogos Geneticamente Modificados", ou seja, desconstruia as fronteiras espaciais, numéricas, temporais e regulamentares dos jogos desportivos tradicionais e misturava as experiências MDE (Mecânicas, Dinâmicas e Estéticas) de vários jogos resultando em jogos diferentes, com desafios distintos.
Numa segunda fase iniciei o estudo da área do "Game Designer dos Jogos de Vídeo" e apercebi-me do quão pouco sabemos sobre jogos e do seu potencial educativo pelo facto de estarmos condicionados e reféns de um programa, de uma oferta normalizada que nos obriga a aplicar uma ementa pré-definida de jogos desportivos e pré-desportivos.
Paralelamente fui investigando também o "Método de Treino Natural (MTN) de Georges Hébert" e apercebi-me do seu imenso potencial educativo que introduz elementos extremamente ricos, muito mais ricos que o modelo olímpico. O MTN introduz as Pistas de Obstáculos, atualmente muito na moda e que são extremamente apelativas e também as "Corridas de Aventura", sempre em contexto natural. A minha experiência como escuteiro no Agrupamento 710 da Benedita, permitiu aprender sobre o trabalho em equipa e a construção de aparelhos de cordas usando varas de eucalipto e nós em corda de sisal ou encaixes de madeira. Esta experiência permitiu-me criar percursos de obstáculos na escola e também no clube de desporto escolar de multi-atividades de ar-livre. Obviamente que a segurança era reforçada com a experiência e formação num curso de "manobras de cordas" utilizando equipamento de escalada homologado.
Decidi, ao longo destes anos, criar espaço curricular para experimentar novas práticas pedagógicas e novos métodos de ensino. Assumi duas posturas que Barry Schwartz descreve no seu livro Practical Wisdom e são uma forma de desobediência ou resistência à conformidade necessárias para se evoluir num ambiente onde as opções de organização curricular estava condicionada pelo “Quadro de Composição Curricular” (Extensão da EF) e pelas escolhas da maioria dos elementos do grupo disciplinar, não restando espaço para matérias alternativas ou outras que fossem. Os blocos de atividades selecionados nos Plano de Turma, estavam reféns do esquema de rotação das turmas pelos espaços (roulement) o que condicionava sempre as interpretações que poderia fazer tendo em consideração as características dos alunos e também a necessidade de investir na divergência pedagógica para realizar experimentação pedagógica.
Eram os horários e os espaços que determinam à priori a circulação da turma pelas instalações. Este sistema permite uma suposta igualdade de oportunidades e homogeneização da aplicação curricular, concretizada pela distribuição equitativa da presença das turmas nos espaços de maior qualidade, mas que resulta num padrão de ensino massivo, sem a necessária diferenciação do tempo e das situações de aprendizagem em função das aptidões e eventuais preferências dos alunos. A solução que encontrei é prática comum entre os professores que sentem a necessidade de fugir a esta rotina e forma estereotipada de abordar a EF:
Primeiro tornei-me num Astuto Fora-da-Lei (Canny Outlaw) porque apresso a parte da obrigação curricular institucionalizada no tempo estritamente necessário para que sobre mais tempo para implementar estratégias e atividades inovadoras e que sei terem um impacto mais positivo na formação da personalidade dos alunos à luz do Novo Paradigma da EF. De certa forma contorno airosamente o programa (AEEF) sem o abandonar, adapto-o, enriqueço-o e interpreto-o doutra forma.
Depois tenho assumido outro perfil que Barry Schwartz chama de Agente de Transformação (System Changer). Ou seja, tenho investido na investigação e na sistematização do modelo teórico que suporta o Novo Paradigma da Educação Física e nas estratégias operacionais do mesmo. Candidatei-me a duas apresentações na 10ª e 11º Congressos Nacionais de Educação Física (CNEF) com o intuito de partilhar novas ideias tendo conseguido uma Menção Honrosa. Depois fui premiado com o Prémio Valorpneu que resultou na construção do 1º Parque de Parkour numa das escolas onde lecionei. Apenas foi possível numa escola recetiva a ideias inovadoras, não sendo possível em escolas conservadoras e resistentes à mudança. Decidi também partilhar estas ideias numa plataforma online e acreditar formação para professores de EF sobre este conteúdo.
Barry Schwartz no seu livro Practical Wisdom – the right way to do the right thing refere que a sabedoria prática pede-nos flexibilidade, criatividade e envolvimento empático. As nossas vidas como professores de EF, dependem de regras: administrativas, burocráticas, pedagógicas e metodológicas, que prescrevem a forma como nos relacionamos e agimos na complexa organização educativa. O nosso comportamento também está determinado por códigos de comportamento ético, legislação que nos diz como proceder em determinadas circunstâncias. Seria impossível viver sem estas regras e acreditamos que um sistema educativo fundado em leis e regras sábias dispensam ou minimizam a necessidade de professores sábios. Porém, nós criamos muitas regras e guiões porque na verdade não confiamos na sabedoria prática dos professores ou, por outro lado, queremos impor uma determinada ideologia do corpo e uma determinada forma de dinâmica social baseada na competição (Sociedade Desportivizada).
Nós moldamos a natureza humana moldando as instituições nas quais as pessoas vivem e trabalham. (…) nós devemos questionar (…) que tipo de natureza humana queremos ajudar a moldar?
Barry Schwartz “Sabedoria Prática”
Educação Física de Qualidade:
Construção da Visão da Educação Física de Qualidade:
Para tornar significativos os currículos de educação física para crianças e jovens do século XXI, teorias inovadoras de aprendizagem e novas perceções da disciplina devem ser consideradas, avaliadas e implementadas (EUROPEAN COMMISSION, 2008). Muitos dados contemporâneos indicam uma deterioração percebida nas atitudes dos estudantes em relação à educação física, devido ao domínio dos desportos competitivos e atividades baseadas no desempenho. (...) Para maximizar a contribuição da educação física para o desenvolvimento de hábitos positivos ao longo da vida, os currículos devem ser flexíveis e abertos à adaptação, para que os professores sejam empoderados a adequar a oferta para atender às diversas necessidades dos jovens com os quais estão trabalhando. Isso deve ser feito por meio de consultas aos jovens para garantir que seus interesses e necessidades sejam refletidos, bem como para fortalecer o engajamento cívico mais amplo por meio da atividade física. (...) Uma abordagem mais equilibrada da educação física capacita todos os alunos, quaisquer sejam seus talentos ou habilidades, a desenvolver seu potencial e aumentar sua competência física, expandindo notavelmente as habilidades que cada participante obtém. O acesso a um currículo bem equilibrado possibilita o desenvolvimento de competências sociais, cooperativas e solucionadoras de problemas. Também facilita a experiência prática para realizar autoavaliações, planear programas pessoais, estabelecer objetivos, auto-avaliação e tomada de decisões (Diretrizes da EF de Qualidade - Para Gestores de Políticas, UNESCO).
O que diz Manuel Sérgio?
"Da Ciência à Transcendência - Epistemologia da Motricidade Humana":
A rede-Motricidade-Humana, embora se inspire nas palavras de Manuel Sérgio, adota uma perspetiva crítica relativamente às mesmas, considerando a experiência prática no "chão-de-escola" um aspeto fundamental na construção do conhecimento o qual se traduz em Sabedoria Prática adquirida (Fronese).
Manuel Sérgio Afirma que "A emergência histórica de uma modernidade desportiva transportou, permanentemente, a discussão sobre os valores que orientam tais práticas e que alicerçam diferentes culturas desportivas. A expressão culturas desportivas recolhe um conjunto amplo de práticas, técnicas, objetos, dispositivos, mitos, valores, narrativas e símbolos próprios das modernidades múltiplas, observáveis tanto no campo desportivo especializado como no âmbito do desporto-lazer inscrito nos quotidianos urbanos. O século XIX conheceu uma particular aliança entre desporto e moral - a performance desportiva foi pensada como uma via de musculação moral do indivíduo. Nos itinerários históricos mais recentes, o corpo atlético de alto rendimento tornou-se uma figura da superação de si e um lugar de sacralização dos quase limitados recursos tecnocientíficos. Por outro lado, no quotidiano dos cidadãos, a nova moral passa pela ascese desportiva, em ordem ao bem-estar e à realização de si. (...) Assim, o desporto pode ser interpretado como uma dramaturgia capaz de condensar e simbolizar o mundo da vida. (...) É particularmente pertinente a aproximação entre a prática desportiva e a experiência da transcendência. Mesmo que se trate de uma forma de Transcendência Horizontal - em relação a si e em relação aos outros - mobiliza a necessidade de uma espiritualidade e de uma ética do esforço e do domínio de si. Por outras palavras, uma ascese. O desporto pode exprimir uma vontade de superação da humana incompletude existencial - de modo mais evidente na intensidade do desporto de alto rendimento".
Transcendência.
Embora reconheça o grande salto qualitativo que Manuel Sérgio introduz na reflexão do desporto, encontro uma limitação nas suas reflexões porque procura elevar o desporto a uma dimensão quase sagrada pelo facto de ser um fenómeno social total segundo a definição de Geoges Gurvitch, a vocação atual da sociologia. O desporto nunca conseguirá ultrapassar o limiar do Jogo Desportivo Finito cuja moralidade é sempre inferior a uma moralidade do Jogo Infinito da Vida que por sua vez é inferior à Moralidade Transcendente numa perspetiva vertical. O Desporto apenas consegue promover a auto-superação em comparação com os outros e está condicionada pelos limites do potencial biológico.
No livro "Da Ciência à Transcendência - Epistemologia da Motricidade Humana" vem mencionado a criação da Cátedra "Manuel Sérgio - Desporto, Ética e Transcendência" lançada no dia 12 de março de 2019, na Universidade católica Portuguesa, com a presença da reitora, a Prof. Doutora Isabel C. Gil e o secretário de Estado da Juventude e do Desporto, o Dr. João Paulo Rebelo. A cátedra procurará contribuir para a abertura de novas linhas de futuro para este pensamento inovador, interagindo com diferentes saberes dentro da universidade e convocando, para esse projeto, atores e instituições dos domínios desportivo e educativo. A Cátedra tem em consideração alguns pressupostos dos quais destaco o seguinte:
Parte-se do reconhecimento do papel e obra de Manuel Sérgio que apresentou os fundamentos de uma nova ciência social e humana, a ciência da motricidade humana, identificando a motricidade humana como movimento intencional de transcendência.
Constata-se que o pensamento de Manuel Sérgio procurou tornar evidente que a prática desportiva e a educação motora dizem respeito à complexidade humana - biopsíquica, social e espiritual.

Manuel Sérgio afirma que na Ciência da Motricidade Humana o que se estuda é o ser Humano, no movimento intencional para a Transcendência. Ora, se bem penso, não há jogos, há pessoas que jogam. (...) O Homem é um ser práxico e em processo, porque é um ser carente e, portanto, um ser que se faz fazendo, ou seja, que sente necessidade de transcender o que tem e o que é, tantas são as suas carências e limitações. (...) Só que a Transcendência, para se realizar, exige uma rotura, um corte, com o atual modelo de crescimento, com uma competição que é a guerra por outros meios - a guerra que parece a categoria estrutural do agir do homem do nosso tempo. (...) As ciência do desporto, pela força multitudinária do próprio desporto e pelo dinheiro que nela circula, ganharam primazia. Mas será que o desporto é tudo, tendo em conta o ser humano em movimento intencional e procurando a superação, a transcendência? Será que o licenciado nesta área do conhecimento vê no desporto de altos rendimentos o único espaço onde pode exercer a sua profissão? (...) E uma transcendência, repito-me, tão física como ética, para que o homem todo e todos os homens dela possam amplamente beneficiar e que, nela, uma antropologia relacional, que liberte e não manipule, seja capaz de desafiar o homo economicus, atualmente dominante no desporto de alta competição (ou de alto nível). Quantas vezes o campeão desportivo não passa de um herói manipulado, reificado, um verdadeiro homem-máquina ao serviço da selva institucional.
De facto, é o próprio Manuel Sérgio que assume que a competição é a base e essência do desporto, uma forma de guerra, uma forma de rivalidade que polariza pessoas, grupos e instituições em todas as dimensões da nossa sociedade, desde a desportiva (obviamente), a política, social e económica. Manuel Sérgio fala das revoluções científicas, roturas epistemológicas e revoluções paradigmáticas que põem em causa o saber institucionalizado e burocrático, académico e ortodoxo e da importância da abertura à heterodoxia, à criatividade, à liberdade, à democracia cognitiva. As Ciências da Motricidade Humana apresentam um novo paradigma: o ser Humano, no movimento intencional e solidário da transcendência (ou superação). Porém, na minha opinião, esta transcendência deve evoluir para lá da visão redutora do desporto, passando pelas atividades e jogos cooperativos e desaguando nas Práticas Integrais ou Holopráxicas tal como caracteriza Pierre Weill em A Mudança de Sentido e o Sentido da Mudança. Estas Atividades Transformativas, que devem ser introduzidas na prática pedagógica dos ainda denominados Professores de Educação Física promovem um desenvolvimento Integral do Complexo Corpo-Mente tal como afirma Michael Murphy no seu livro The Future of the Body - Explorations into the Further Evolution of Human Nature.

Michael Murphy co-fundador do Esalin Institute escreveu no capítulo 19 - Aventura e Desporto, refere que muitos atletas vivem momentos extáticos de estados modificados de consciência que por vezes tocam a fronteira do místico. Porém, numa aula de Educação Física, está fora de questão levar os alunos aos limites da sua resiliência física, emocional e mental e por isso, existem muitas práticas acessíveis que facilitam a possibilidade de explorar os estados modificados de consciência com imensos benefícios para a sua saúde integrativa do complexo corpo-mente.
Nós fomos condicionados a observar a saúde como uma consequência de um corpo ativo, um corpo que pratica atividade física e também desportiva. Como Professores de Educação Física queremos que os nossos alunos elevem a sua Aptidão Física através da elevação do seu metabolismo (super-metabolismo) porque isso é sinónimo de saúde. Para tal propomos desafios físicos (exercícios calisténicos e jogos desportivos) com o intuito de elevar os parâmetros fisiológicos. Porém não fomos treinados na exploração dos estados hipo-metabólicos que promovem muitos benefícios comparativamente aos estados super-metabólicos. Os atletas de alto rendimento procuram sobretudo os estados hiper-metabólicos e por isso levam o seu corpo ao limite de resiliência física o que acarreta sobrecarga nas estruturas fisiológicas, aumentando o risco de lesões e outros problemas de saúde. Os professores de Educação Física conhecem muito sobre as zonas de intensidade do esforço tendo como referência a Frequência Cardíaca, conhecendo o impacto sobre a Aptidão Física porém, desconhecem a importância da Variabilidade da Frequência Cardíaca e como é que as aulas de EF poderiam melhorar significativamente se os alunos fossem introduzidos a este parâmetro Psico-Fisiológico ou cardio-neuro-imunológico através de atividades Body and Mind.

Quando se pretende implementar atividades hipometabólicas, obviamente que o objetivo ultrapassa a dimensão fisiológica tradicional para se centrar numa atenção consciente (eutónica) dos processos interiores e aumentar a consciência de si e do mundo à sua volta. Esta dimensão apela a uma nova conceção biológica que privilegia a unidade mente-corpo e o desenvolvimento da interioridade humana. A introdução dos Estados Hipometabólicos numa prática corrente da Disciplina de EF tem como objetivo ajudar os alunos a entrarem em contacto consigo próprios (meditação), para depois recuperar a sensação de segurança, ou seja, acalmar os sobreexcitados circuitos emocionais. Para se aquietar a mente é importante aquietar o corpo. Intuitivamente os Mestres ZEN diagnosticaram um problema humano básico: as nossas redes associativas cerebrais estão abarrotadas com pensamentos discriminativos. Este facto reverbera com os circuitos afetivos e viscerais ancestrais, de atitudes impressas desde a infância com noções fortemente matizadas do certo e do errado, James H. Austin (1999).

Embora concorde com a afirmação de Mark Brackett quando afirma que todas as emoções enquadradas no Mood Meter têm uma finalidade e são importantes, o objetivo da educação (se pretende educar os jovens para uma sociedade da paz e harmonia), deverá privilegiar as emoções coerentes (cor amarela – agradável, elevada energia e cor verde – agradável, baixa energia). As crianças terão de aprender a exprimir e a regular todo o espectro de emoções, mas são as emoções coerentes que aumentam a atividade parassimpática, incrementando a sincronização coração-cérebro e promovem um encadeamento entre vários sistemas fisiológicos.

A competição promove emoções no quadrante vermelho e o insucesso na competição e na avaliação escolar promove emoções no quadrante azul do Mood Meter. Os Estados Hipometabólicos facilitam os estados coerentes (coerência psicofisiológica) e o contacto com os estados de paz e calma interiores.

Prestar atenção ao funcionamento e comportamento do próprio corpo é a ideia básica da consciência corporal. É uma espécie de autoconhecimento, ou seja, entender o que o corpo é capaz de fazer, bem como as suas limitações e potencialidades. Relaxamento Muscular Progressivo é uma técnica de relaxamento criada pelo médico e fisiólogo americano Edmund Jacobson, um médico Americano de medicina interna, psicólogo e assistente em fisiologia. Em 1921, introduziu os princípios psicológicos para a prática médica que mais tarde foram chamados de medicina psicossomática. Jacobson foi capaz de provar a ligação entre a tensão muscular excessiva e diferentes distúrbios do corpo e psique. Descobriu que a tensão e esforço eram sempre acompanhados por um encurtamento das fibras musculares e que a diminuição do tónus muscular inibe a atividade do sistema nervoso central. O relaxamento contraria estes estados de excitação e quando bem-adaptada, funciona de forma profilaxia prevenindo os distúrbios psicossomáticos. A tensão nervosa é uma doença mais comum que a própria constipação e representa um muito maior perigo. A tensão pode reduzir a nossa eficiência, destruir a nossa saúde e encurtar a esperança média de vida (Edmund Jacobson, 1980; “You Must Relax”). A escola é uma instituição que promove o stresse face à pressão nos resultados académicos. A Educação Física tem um papel importante neste campo recorrendo a estas técnicas para promover a saúde e o bem-estar. Olhar para o papel da Educação Física apenas em função dos estímulos ou cargas moderadas ou vigorosas (super-metabolismo) como forma de contrariar o sedentarismo ou a falta de movimento, é uma forma muito reducionista de explorar a motricidade humana.
Os benefícios dos estados hipometabólicos podem caracterizar-se, em termos fisiológicos, pelos seguintes parâmetros:
Os alunos apercebem-se que são capazes de criar paz dentro deles da mesma forma que podem criar medo e preocupação;
Aprendem a acalmar as emoções, aquietar a mente e controlar as distrações que o corpo produz;
O RMP facilita a possibilidade de auto-conhecimento e autodomínio; por outras palavras, aprende-se a transcender a ideia de que os nossos corpos estão fora do nosso controlo e apercebemo-nos que as nossas emoções, pensamentos e intenções são uma força que produz alterações nos nossos corpos e assim, os nossos corpos são uma extensão da nossa mente;
Relaxamento profundo de dominância parasimpática;
O Sistema nervoso parasimpático tem uma ação cronotrópica negativa (< FC), e dromotrópica negativa (< condução a nível supraventricular).
Durante o relaxamento diminui o tónus simpático e aumenta o tónus vagal:
< níveis de catecolaminas;
> resistência galvânica da pele significativa;
> profusão cerebral;
< significativa diminuição da taxa respiratória por minuto;
< resistência vascular;
< consumo de O2 e CO2;
Ética
O Currículo Oculto do Desporto:
Preocupamo-nos bastante com os valores que os alunos interiorizam nas aulas de EF através da prática desportiva mas desconhecemos que a Moralidade do Jogo Desportivo é uma forma de moralidade inferior que Manuel Sérgio refere quando associa a subjugação do desporto de alto rendimento ao poder económico envolvido. Os valores transmitidos pelo Jogo Desportivo (Ética) são valores limitados pela própria experiência MDE (Mecânica, Dinâmica e Estética). Se, tal como Manuel Sérgio afirma, a linguagem da Motricidade Humana não é a do simples movimento, mas do movimento intencional e solidário da Transcendência, então teremos que utilizar instrumentos pedagógicos que facilitem essa mesma Transcendência Vertical em vez da mera Transcendência Horizontal que privilegia sobretudo um desenvolvimento estritamente material (fisiológica e mecânica/técnica) da relação dos alunos com o seu corpo e deste com a saúde.
Todos sabemos que para Manuel Sérgio a questão Ética assume uma centralidade bastante marcante. O próprio Manuel Sérgio afirma (Da Ciência à Transcendência) que os Professores de EF e os Treinadores Desportivos e os Professores que trabalham no âmbito da Motricidade Humana (desporto paralímpico, jogo desportivo, dança, ergonomia, motricidade infantil, reabilitação, etc...), são especialistas em humanidades, ultrapassando em muito os limites das ciências do desporto (sem as excluir) e de uma debilitada Educação Física. Os professores de EF são especialistas em Humanidades porque, no meu entender, devem refletir sobre o tipo de valores implícitos nas suas práticas pedagógicas, ou seja, o que é que os alunos estão a interiorizar quando participam em jogos desportivos coletivos? Uma pessoa que luta pela excelência física, intelectual e moral, ou seja, que a mediocridade não satisfaz, é sempre digna de louvor e de aplauso. Porém, se eu como professor de EF, coloco dentro da minha caixa de ferramentas pedagógica apenas instrumentos que promovem uma moralidade inferior quando eu tenho como objetivo o desenvolvimento de uma moralidade superior, estou em contradição e por isso não me posso lamentar se os alunos apenas pensam no seu interesse próprio, assumem normal roubar (a bola das mãos dos outros) ou bloquear o seu caminho para o sucesso ou ainda utilizar a desinformação como estratégia legítima para induzir os outros em erro. Estes são o tipo de valores inerentes ao desporto. Serão estes os valores de uma sociedade que se pretende cheia de uma moralidade superior?
Que Perfil de Aluno Queremos?

1º Argumento:
Um jogador num jogo desportivo coletivo, para além de saber dominar a informação, também tem que dominar a desinformação que é um elemento estranho nas relações sociais saudáveis. A desinformação é uma metáfora à realidade dentro da “Caverna de Platão” e corresponde ao mundo das sombras, da ilusão, do engano. Ou seja, tem que saber comunicar corretamente com os seus colegas de equipa, mas também induzir os adversários em erro através de desinformação. Relativamente aos seus colegas, a informação tem que ser precisa e verdadeira para que a bola chegue em condições a quem se desmarca para uma posição vantajosa, próxima do alvo. Mas também tem que ser falsa, carregada de ruído para criar equivoco no adversário e assim tirar vantagem disso. O ruído assume a forma de simulações corporais, fintas com mudanças bruscas de direção, etc. que provoquem no adversário respostas desajustadas e o coloquem fora do caminho do alvo. Ou seja, a desinformação corresponde à utilização das técnicas de comunicação e informação (corporal), para induzir em erro ou dar uma falsa imagem da realidade (intenção), mediante a supressão ou ocultação de informações, minimização da sua importância ou modificação do seu sentido. Mesmo uma pequena quantidade de incerteza gera uma resposta de “erro” no córtex frontal orbital (COF). Isso desvia a atenção dos objetivos, forçando a atenção para o erro (Hedden, Garbrielli, 2006). Se alguém não partilha toda a verdade, ou age de forma incongruente (desinformação), a incerteza resultante pode desencadear erros no COF. Quantidades maiores de incerteza (desinformação) podem ser altamente debilitantes provocando frustração que conduz à raiva. Ou seja, um bom Professor ou treinador é aquele que, para além de ensinar os alunos/atletas a utilizar uma linguagem corporal correta (técnica), também os ensina a mentir, que é o nome dado às afirmações corporais dissimuladas e enganosas (falsas), mas propositadas. Ou seja, cria ambientes propícios à frustração. Mentir é contra os padrões morais de muitas pessoas e é tido como um “pecado” em muitas religiões. Porém, é considerado normal e até altamente valorizado num atleta ou aluno que domina as técnicas e táticas de desinformação (mentira). Ou seja, é como se houvesse dois tipos de mentira, um aprovado e que se relaciona com a mestria corporal, técnico-tática, sem violar as regras do jogo, e a outra forma de mentir, na qual o jogador procura tirar partido de uma situação de disputa direta ou confronto da bola através de uma carga de ombro faltosa, rasteirando ou obstruindo o outro, impedindo-o de chegar à bola. Assim, também existem formas legítimas e ilegítimas de obstruir o adversário dependendo se o defesa tem a sua posição definida antes do contacto com o atacante. Ou seja, mentir é favorável ao sucesso desde que se faça dentro das regras. Porém, mentir é mentir e numa sociedade que valorize a transparência, a verdade e a confiança mútua, a desinformação é e será sempre, uma forma moralmente duvidosa de se ter sucesso porque se obstruí a verdade, contamina a confiança nas relações e contraria o “Sentido Moral” e o “Instinto Social” que Darwin estudou nas sociedades primitivas. Parece que desde a Revolução Industrial introduzimos elementos estranhos no nosso sistema de crenças responsáveis pela “Roda da Destruição” (A Competição apoiada na desinformação). James P. Carse “Finite and Infinite Games” afirma que os jogadores finitos são treinados para evitar que o futuro altere o passado e por isso devem esconder as suas jogadas futuras. O oponente despreparado deve ser mantido assim. Os jogadores finitos devem parecer ser algo diferente do que são. Tudo que esteja relacionado com a sua aparência deve ser ocultado e por isso todas as movimentações (jogadas) dos jogadores finitos devem ser enganosas: fintas, distrações, falsificações, direções erradas, mistificações. O objetivo do treino consiste em preparar os jogadores finitos contra a surpresa (antecipação) de forma a minimizar a vulnerabilidade e a incerteza. Ou seja, o treino prepara os jogadores para representarem papeis e usarem máscaras que escondem as suas intenções frente ao adversário.
Manuel Sérgio também enaltece o desporto como escola de vida na medida em que ensina, sem cessar, que preciso dos outros (principalmente dos colegas, mas também dos adversários) para atingir os objetivos que se propõem alcançar. O desporto, uma escola de vida, porque uma escola de solidariedade. Porém, este tipo de argumentos é falacioso porque para que os alunos compreendam e aprendam que precisam dos outros não precisam de jogos de oposição, podem simplesmente ser introduzidos aos jogos de cooperação. E esta é uma das grandes limitações da maioria dos pensadores no campo da motricidade humana, estão todos eles reféns da sua lealdade para com a ideologia desportiva e não conseguem cortar o cordão umbilical desta forma de ver a realidade, procurando sistematicamente enaltecê-la, embelezá-la e exacerbá-la sem explorar as suas limitações, ou colocando o defeito no dinheiro que corrompe o desporto, ou noutros interesses exteriores e alheios a ele que o desvirtuam. Porém, a ideologia da oposição, da competição própria do jogo desportivo tem as suas limitações intrínsecas que é preciso assumir sem entrar em dissonância cognitiva.
Para construir uma sociedade coesa, unida em busca da transcendência eu não preciso de adversários, eu não preciso que os outros me obstruam o caminho para o sucesso, já nos chegam as adversidades, os obstáculos burocráticos, os engarrafamentos de trânsito, os acidentes na estrada, as obras na via pública, os andaimes no passeio ou os prédios sem elevador. Muito menos preciso de pessoas que não sentem vontade em nos servir, seja numa repartição de finanças, num restaurante, num hospital ou noutro local qualquer, ou criam rivalidades. Não precisamos que as pessoas nos criem obstáculos ou compitam connosco, que nos desafiem na busca da auto-superação ou a transcendência. Quem acredita nisto é porque ainda não se questionou profundamente sobre o verdadeiro sentido da vida. As distorções sociais próprias da relação competitiva não são normais, são o reflexo da nossa falta de amor e da falta de identidade espiritual e sobretudo da pouca compreensão da ciência e consciência da ciência da resolução de conflitos.
2º Argumento
G. Jones e Mike Mcnamee num artigo muito pertinente intitulado Moral reasoning, Moral Action, and the Moral Atmosphere of Sport, citam Norma Haan quando apresenta a reflexão sobre a investigação psicológica relativamente ao desenvolvimento do caráter e moral no desporto. Esta autora refere que o diálogo moral adequado se caracteriza pela consideração imparcial, isenta dos desejos, necessidades e objetivos dos outros. Demonstrar os requisitos do nível mais elevado de Haan, o nível 5, é abordar o diálogo de forma justa. No desporto, porém, o objetivo (ao contrário do diálogo moral de Haan) não é igualar as relações. O princípio competitivo no desporto é precisamente garantir a vitória (dentro das regras), o que impede necessariamente o(s) adversário(s) de fazer o mesmo. Os jogos têm uma estrutura de soma zero: se ganhas, eu devo perder, e vice-versa. Bredemeier e Shields (1984) defendem que o diálogo moral no desporto, devido à necessária procura do interesse próprio envolvido, tendem a ser mais egocêntricos e menos imparciais por natureza do que noutros contextos. No desporto, existe uma clara vantagem em dominar e possivelmente intimidar o adversário. Qualquer tipo de vantagem física ou mental é exigida para garantir a vitória. Este pode ser visto como um comportamento egoísta, egocêntrico ou de interesse próprio e, como tal, é a antítese da ação moral moralmente madura quando julgada em relação aos níveis morais de Kohlberg ou Haan.
Bredemeier e Shields (1984, p. 351) acreditam que os níveis de raciocínio moral sobre os dilemas do desporto seriam significativamente mais baixos do que os níveis de raciocínio moral sobre os dilemas da vida. Se a estrutura do desporto de competição for entendida na nossa cultura como algo que encoraja interesses próprios específicos do contexto, ao mesmo tempo que desencoraja o diálogo moral, então os dilemas desportivos podem suscitar níveis mais baixos de raciocínio moral como respostas contextualmente apropriadas.
Esta ideia de que a competição desportiva requer necessariamente uma ação de interesse próprio é confirmada pelos resultados de Bredemeier e Shields (1984). Os resultados confirmaram, de um modo geral, a hipótese de que o raciocínio moral no desporto é mais egocêntrico (menos maduro) do que o raciocínio moral sobre a vida de acordo com os níveis morais de Haan (1983). Os autores usam o termo moralidade entre parêntesis para conotar dois pontos:
Em primeiro lugar, a troca moral que ocorre no desporto é diferente da da vida quotidiana, onde a ação moral madura é marcada pela atenção à equalização relacional em termos de obrigações e benefícios. O desporto, no entanto, é caracterizado por um maior grau de liberdade pessoal e por uma diminuição da responsabilidade relacional. Concentrar-se no interesse próprio não é apenas permitido no desporto, é pressuposto. Mas nem todas as ações que apoiam o interesse próprio são moralmente apropriadas, mesmo no desporto.
Em segundo lugar: a moralidade entre parêntesis conota uma forma de ação moral que está aninhada dentro de uma moralidade mais ampla e abrangente — a moralidade da vida quotidiana.
Esta reflexão leva-nos a questionar o desporto como "escola de vida" sobretudo na sua dimensão ética que fica aquém da moralidade exigida na vida quotidiana.
3º Argumento:
Quando se partilham ideias não convencionais com os pares normalmente desencadeia-se um conflito aceso de ideias e argumentações sem que haja disponibilidade interior para escutar, porque se parte de uma mentalidade competitiva. Em vez de se gerar uma controvérsia construtiva, a discussão evolui para um debate competitivo porque de uma forma geral fomos programados para competir a todos os níveis nesta sociedade, inclusive por territórios mentais, ideias. David Rock no seu artigo SCARF: a brain-based model for collaborating with and influencing others, refere e muito bem que muitas conversas ou discussões diárias evoluem para conversas argumentativas próprias de um debate competitivo derivados do sentimento de ameaça ao estatuto, um desejo de não ser percebido como inferior ao outro. Ao longo dos tempos tenho-me apercebido que é difícil estabelecer controvérsias construtivas com os meus pares que vêm este tipo de discussão como uma oportunidade para competir pela argumentação em vez de reconhecer o valor e riqueza de novas ideias e as possibilidades e oportunidades de novas formas de ver a EF.
Qual a diferença entre uma controvérsia construtiva e um debate competitivo?
Controvérsia construtiva – os intervenientes discutem as suas diferenças com o objetivo de as clarificar procurando encontrar soluções que integrem as melhores ideias que emergem durante a discussão, independentemente de quem as articula. Não existe um vencedor ou um perdedor porque ambos vencem e beneficiam de uma perceção mais amadurecida e aprofundada do problema. Este modelo permite gerir de forma positiva as diferenças que as pessoas trazem para o debate cooperativo, valorizando as diferenças de compreensão, perspetivas, conhecimentos e visões de mundo enquanto recursos válidos. A cooperação induz e é induzida pelas semelhanças de crenças e atitudes percebidas, prontidão para ser útil, abertura para a comunicação, atitudes amigáveis e de confiança, sensibilidade para com os interesses comuns, evitar a crispação relativa aos interesses opostos, orientação no sentido de aumentar o poder mútuo em vez de potenciar as diferenças.
Debate competitivo – aqui existe sempre um vencedor e um perdedor. Cada fação assume possuir as melhores ideias, capacidades, conhecimentos ou outros argumentos e tipicamente vence enquanto a outra, que é julgada ou avaliada como inferior (menos boa) perde. A competição avalia e categoriza (hierarquizar) as pessoas em função da sua capacidade para desempenhar uma determinada tarefa em vez de integrar as várias contribuições. A competição é induzida pelas táticas de coerção, ameaça, engano com o intuito de aumentar as diferenças de poder entre os adversários, sobressai uma comunicação empobrecida (ineficaz), desvalorização da consciência das semelhanças em termos de valores e um aumento da sensibilidade relativamente a interesses opostos que fomentam atitudes hostis e de suspeição/desconfiança que por sua vez exageram a importância, rigidez e dimensão das questões em conflito verificando-se uma escalada de tensão.
Morton Deutch no seu livro The Resolution of Conflict - Constructive and destructive processes, quando fundamenta a sua teoria de resolução de conflitos que facilita o processo de paz, refere que:
"Os processos construtivos de resolução de conflitos são semelhantes aos processos cooperativos de resolução de problemas e.
Em contrapartida, os processos destrutivos de resolução de conflitos são semelhantes aos processos competitivos".
A investigação também mostrou que a resolução construtiva de conflitos inerente aos jogos cooperativos é superior em resultados comparativamente aos processos competitivos de resolução de conflitos.
Os objetivos das pessoas podem estar ligados por vários motivos:
A interdependência positiva manifesta-se em pessoas que gostam umas das outras, são recompensadas em termos das suas realizações conjuntas, precisam de partilhar um recurso ou de ultrapassar um obstáculo em conjunto, mantêm uma associação ou identificação comum com um grupo cujo destino é importante para elas, são incapazes de atingir os seus objetivos de tarefa a menos que partilhem o trabalho, são influenciadas pela personalidade e orientação cultural, são unidas porque são tratadas dessa forma por um inimigo comum ou uma autoridade, e assim por diante. A interdependência positiva é o coração da Aprendizagem Cooperativa. É a sensação que se tem de se estar dependente dos outros de modo que não se consegue ser bem sucedido se os outros também não o forem. Tem por base a convicção de que o êxito de cada elemento do grupo está vinculado ao êxito do grupo, de que o grupo só é bem sucedido se todos os seus elementos o forem. Nos grupos cooperativos existem vários tipos de interdependência:
Interdependência de objetivos.
Interdependência positiva de tarefas.
Interdependência positiva de recursos.
Interdependência positiva de identidade.
Interdependência positiva de papeis.
Interdependência positiva de recompensas e celebrações.
Da mesma forma, no que diz respeito à interdependência negativa, esta pode resultar de pessoas que não gostam umas das outras; ou de serem recompensados de tal forma que quanto mais um recebe em termos de recompensa, menos recebe o outro (jogos de oposição).
Para além da interdependência positiva e negativa, é bom reconhecer que pode existir uma falta de interdependência, ou independência, pelo que as atividades e o destino das pessoas envolvidas não se afetam umas às outras, direta ou indiretamente. Se forem completamente independentes um do outro, não haverá conflito; A existência de um conflito implica alguma forma de interdependência.
Se numa aula de Educação Física o professor assumir como objetivo promover dinâmicas relacionais de resolução de conflitos não terá necessariamente que implementar jogos de oposição (jogos desportivos) onde prevalece a interdependência negativa. Poderá implementar a Pedagogia Cooperativa, seja através de Métodos de Aprendizagem Cooperativos e/ou Jogos Cooperativos (Team-Building) organizando os grupos de forma heterogénea onde a probabilidade de estarem no mesmo grupo, alunos que nutrem uma relação de antipatia é grande. Desta forma os alunos, para cooperar e atingir os seus objetivos comuns são primeiro confrontados com a necessidade de resolver os seus diferendos, trabalhar a intolerância e a hostilidade através de abordagens dialógicas e Competências Sócio Emocionais. É frequente no seio das equipas de alunos que participam nos jogos desportivos coletivos manifestarem hostilidades devido às situações de conflito de interesses próprios da interdependência negativa.

As relações cooperativas (aquelas em que os objetivos das partes envolvidas são predominantemente interdependentes positivamente), comparativamente às relações competitivas, apresentam mais características positivas:
Relações Cooperativas:
A comunicação eficaz acontece. As ideias são verbalizadas, e os membros do grupo estão atentos uns aos outros, aceitando as ideias dos outros membros e sendo influenciados por elas. Têm menos dificuldades em comunicar ou compreender os outros.
Simpatia, disponibilidade e menos obstrução são expressas nas discussões. Os membros também estão mais satisfeitos com o grupo e sentem-se positivamente impressionados com as contribuições dos outros membros do grupo. Além disso, os membros dos grupos cooperativos consideram-se muito interessados em ganhar o respeito dos colegas e sentem comprometidos para com os outros membros.
A coordenação de esforços, a divisão do trabalho, a orientação para a realização das tarefas, a ordem na discussão e a elevada produtividade são manifestadas em grupos cooperativos (se a tarefa do grupo exigir uma comunicação eficaz, coordenação de esforços, divisão do trabalho ou partilha de recursos).
Os sentimentos de concordância com as ideias dos outros e um sentido de semelhança básica nas crenças e valores, bem como a confiança nas próprias ideias e no valor que os outros membros atribuem a essas ideias, são obtidos em grupos cooperativos.
Reconhecer e respeitar o outro sendo recetivo às suas necessidades.
A disposição para aumentar o poder do outro (por exemplo, o conhecimento, as habilidades, os recursos e assim por diante) para que ele atinja os seus objetivos aumenta. À medida que as capacidades, conhecimentos e competências do outro são fortalecidas, nós saímos fortalecidos; elas são valiosas para você e para o outro. Da mesma forma, o outro é valorizado a partir da nossa valorização verificando-se um benefício mútuo.
Definir interesses conflituantes como um problema mútuo a resolver através de um esforço colaborativo facilita o reconhecimento da legitimidade dos interesses de cada um e a necessidade de procurar uma solução que vá ao encontro das necessidades de todos. Tende a limitar, em vez de expandir, o âmbito dos interesses conflituantes. As tentativas de influenciar os outros tendem a limitar-se a processos de persuasão.
Em contraste, um processo competitivo tem efeitos opostos:
A comunicação fica prejudicada porque as partes em conflito tentam obter vantagem enganando a outra através de falsas promessas, táticas de lisonja e desinformação. É reduzida e vista como fútil, pois reconhecem que não podem confiar que as comunicações sejam honestas ou informativas.
A obstrução e a falta de inter-ajuda levam a atitudes negativas mútuas e à suspeita das intenções de cada um. As perceções que uma pessoa tem do outro tendem a focar-se nas qualidades negativas da pessoa e a ignorar as positivas.
As partes do processo não conseguem dividir o seu trabalho, duplicando os esforços umas das outras, pelo que se tornam imagens espelhadas; Se dividem o trabalho, sentem a necessidade de verificar continuamente o que o outro está a fazer (falta de confiança).
A experiência repetida de desacordo e a rejeição crítica de ideias reduz a confiança em si próprio e nos outros.
As partes em conflito procuram aumentar o seu próprio poder e reduzir o poder do outro. Qualquer aumento do poder do outro é visto como uma ameaça para o próprio.
O processo competitivo estimula a visão de que a solução de um conflito só pode ser imposta por um lado sobre o outro, o que, por sua vez, leva ao uso de táticas coercivas, como ameaças psicológicas e físicas, e violência. Tende a alargar o âmbito das questões em conflito, pois cada lado procura a superioridade em poder e legitimidade. O conflito torna-se uma luta de poder ou uma questão de princípio moral e já não se limita a uma questão específica num determinado momento e lugar. A escalada do conflito aumenta a sua importância motivacional para os participantes e pode tornar uma derrota limitada menos aceitável e mais humilhante do que um desastre mútuo.
À medida que o conflito aumenta, perpetua-se através de processos como a hostilidade autista, as profecias auto-realizadoras e os compromissos involuntários. A hostilidade autista implica interromper o contacto e a comunicação com os outros; O resultado é que a hostilidade é perpetuada porque não há oportunidade de aprender que pode ser baseada em mal-entendidos ou erros de julgamento, nem de saber se o outro mudou para melhor.
As profecias auto-realizáveis são aquelas em que uma parte se envolve em comportamentos hostis em relação a outra pessoa por causa de uma falsa suposição de que a outra pessoa fez ou se está a preparar para lhe fazer algo prejudicial; A sua falsa suposição torna-se realidade quando o leva a envolver-se num comportamento hostil que, em seguida, provoca o outro a reagir de forma hostil a si. A dinâmica de um conflito crescente e destrutivo tem a qualidade inerente de uma folie à deux, na qual as profecias auto-realizadoras de cada lado se reforçam mutuamente. Como resultado, ambos os lados têm razão em pensar que o outro é provocador, indigno de confiança e malévolo. Cada lado, no entanto, tende a ser cego em relação à forma como ele e o outro contribuíram para este processo maligno.
No caso de compromissos involuntários, durante o decurso de um conflito crescente, as partes não só se comprometem excessivamente com posições rígidas, como também podem involuntariamente comprometer-se com atitudes e perceções negativas, crenças, defesas contra os ataques esperados do outro e investimentos envolvidos na execução das suas atividades conflituosas. Assim, durante um conflito intensificado, uma pessoa (um grupo, uma nação) pode comprometer-se com a visão de que o outro é um inimigo mau, a crença de que o outro está a tentar aproveitar-se de si próprio (do seu grupo, nação), a convicção de que é necessário estar constantemente vigilante e pronto para se defender contra o perigo que o outro representa para os seus interesses vitais, e também investir em meios de se defender e atacar o outro. Após um conflito prolongado, é difícil abdicar de um rancor, desarmar-se sem se sentir vulnerável, bem como abdicar da carga emocional associada à mobilização e à vigilância em relação ao conflito.
4º Argumento:
Anne-Kathrin J. Fett e colaboradores no artigo Default distrust? An fMRI investigation of the neural development of trust and cooperation, referem que a tendência para confiar e cooperar aumenta desde a adolescência até à idade adulta. Embora os seres humanos sejam sociais por natureza, as capacidades cognitivas que constituem a base para interações sociais bem-sucedidas não está totalmente desenvolvida ao nascer, mas evoluem gradualmente ao longo do tempo. Durante a transição da adolescência para a idade adulta, o comportamento social torna-se cada vez mais orientado para os outros. Tem sido sugerido que a melhoria da mentalização e da sensibilidade à perspetiva dos outros impulsiona o aumento da confiança e da cooperação. A rede cognitiva social apoia a mentalização (processo de interpretação dos sinais sociais dos outros) e é importante para minimizar a traição. Embora a cooperação pareça ser uma preferência dos adultos, os estudos de desenvolvimento que utilizam jogos de confiança sugerem que nos adolescentes existe uma tendência para se investir menos e ter menos interações recíprocas/cooperativas. Esta mudança na qualidade das interações sociais foi atribuída à menor propensão dos adolescentes para a mentalização e a uma sensibilidade subsequentemente reduzida aos sinais sociais dos outros.
Coloca-se a questão:
Que impacto tem, nestas fases de desenvolvimento do comportamento social, imergir os jovens e crianças, em ambientes competitivos (Jogos Desportivos) no contexto educativo a nível do seu desenvolvimento moral?
Artur Czeszumski e colaboradores no estudo Cooperative Behavior Evokes Interbrain Synchrony in the Prefrontal and Temporoparietal Cortex: A Systematic Review and Meta-Analysis of fNIRS Hyperscanning Studies, referem que os seres humanos são uma espécie cooperativa. Os seres humanos cooperam em pequena escala, como amigos ou família e, em escala maior, como Estados-Nação. No entanto, existem muitos casos em que a cooperação falha, desde os argumentos conflituosos entre casais passando por conflitos políticos, levando a resultados abaixo do ideal tanto para os indivíduos como para a sociedade. Para compreender as complexidades da cooperação e ajudar as pessoas a melhor perceber o seu potencial cooperativo, é útil e necessário obter uma melhor compreensão científica da cooperação. Uma questão científica fundamental é a forma como a cooperação se processa no cérebro. Nas últimas três décadas, surgiu uma grande literatura sobre a neurociência social. Uma limitação da investigação tradicional em neurociência social é que os participantes não estão diretamente envolvidos na interação social. Para ultrapassar este problema, os investigadores adotaram uma abordagem neurocientífica verdadeiramente social envolvendo uma segunda pessoa. Na neurociência da segunda pessoa, os processos neuronais são examinados dentro do contexto de uma interação social recíproca em tempo real. O desenvolvimento recente em neuro-imagiologia permitiu o chamado “hyperscanning”, onde a atividade de dois ou mais cérebros pode ser avaliada simultaneamente enquanto as pessoas estão a interagir. A atividade inter-cerebral resultante é geralmente caracterizada em termos da sincronização da atividade funcional dos cérebros que interagem. Até ao momento, os estudos de “hyperscanning” revelaram que a sincronização intercerebral desempenha um papel crucial na atenção conjunta, na comunicação e coordenação interpessoal, na cooperação e na tomada de decisões.

Quando as pessoas cooperam, a sua atividade neuronal tende a sincronizar-se mutuamente. Esta sincronização inter-cerebral durante as tarefas de cooperação tornou-se o foco de um número crescente de estudos de “hyperscanning”. Os resultados mostraram que a cooperação está consistentemente associada à sincronização inter-cerebral nas áreas frontal e temporo-parietal, sugerindo que o alinhamento neuronal inter-cerebral nestas regiões fundamenta o comportamento cooperativo em humanos.
Guillaume Dumas e colaboradores no estudo Inter-Brain Synchronization during Social Interaction referem que durante a interação social, ambos os participantes estão continuamente ativos, cada um modificando as suas próprias ações em resposta às ações em constante mudança do parceiro. Esta adaptação mútua contínua resulta em sincronização interativa para a qual ambos os membros contribuem. A cooperação alicerça-se numa boa capacidade de comunicação entre os intervenientes. Esta adaptação mútua contínua gera sincronização e alternância de turnos entre parceiros, resultando numa sincronização interacional.

Jean Decety e colaboradores no estudo intitulado The neural bases of cooperation and competition: an fMRI investigation, estudaram a cooperação e a competição enquanto modos básicos de cognição social que exigem a adoção de um conjunto mental específico. Neste estudo de fMRI, os indivíduos jogaram um jogo de computador especialmente desenvolvido, de acordo com um conjunto de regras predefinidas, em cooperação ou competição com outra pessoa. Os investigadores verificaram que regiões distintas estavam seletivamente associadas à cooperação e à competição, principalmente o córtex orbitofrontal no primeiro caso e o córtex parietal inferior e pré-frontal medial no segundo. Este padrão reflete as diferentes estruturas mentais envolvidas na cooperação e na competição com outra pessoa. Uma abordagem evolutiva da cognição social prevê, portanto, mecanismos de cooperação, altruísmo e outros aspetos do comportamento pró-social, bem como mecanismos de coerção, engano e manipulação de membros da mesma espécie. A teoria evolucionista clássica enfatiza as interações competitivas baseadas na luta pela vida e na sobrevivência dos mais aptos. A cooperação também é comum entre membros da mesma espécie e é de facto vantajosa para os indivíduos porque aumenta a sua aptidão para a sobrevivência. Entre os humanos, em particular, a cooperação parece ter sido elevada como parte integrante da sociedade.
Uma sociedade madura é uma sociedade cooperativa e superiormente organizada. Uma sociedade competitiva é uma sociedade que precisa transcender esse estado de imaturidade.
A cooperação e a competição envolvem funções executivas e competências de mentalização, ambas desempenham um papel crucial durante as interações sociais. As funções executivas abrangem vários aspetos da criação de comportamentos flexíveis, incluindo a capacidade de:
Escolher um curso de ação em situações novas,
Suprimir um curso de ação predominante que já não é apropriado e,
Monitorizar a ação atual em curso.
É também de notar que tanto a cooperação como a competição envolvem a antecipação do comportamento do parceiro social, o que depende muito da “mentalização”, ou seja, da capacidade de explicar e prever o comportamento do outro atribuindo-lhe estados mentais independentes, como pensamentos, crenças, desejos e intenções, que são diferentes dos nossos. Isto é particularmente verdade na competição quando os parceiros sociais têm objetivos divergentes. Tanto as interações cooperativas como as competitivas exigem uma monitorização própria e do outro, ou seja, a capacidade de orientar o pensamento e a ação de acordo com as intenções internas e as dos outros. Além disso, existem evidências da psicologia do desenvolvimento que sugerem que esta monitorização difere entre contextos colaborativos e não colaborativos. Existem muitas evidências científicas da psicologia evolutiva bem como da psicologia do desenvolvimento que demonstram que cooperar é socialmente mais compensador do que competir. Além disso, existem razões teóricas para supor que as exigências de mentalização na cooperação e competição diferem em alguns aspetos. No caso da competição, o comportamento futuro do adversário é menos previsível (desinformação) comparativamente ao caso da cooperação, em que existe uma expetativa clara quanto ao comportamento do outro agente. A cooperação proporciona um incentivo social e está associada ao envolvimento orbitofrontal direito, e a competição requer recursos de mentalização adicionais e está associada a um aumento da atividade pré-frontal medial. Na vida quotidiana, a nossa interação com os outros envolve estados mentais cooperativos e competitivos que geram diferentes objetivos motivacionais.
Minhye Lee e colaboradores no artigo Cooperative and Competitive Contextual Effects on Social Cognitive and Empathic neural responses, procuraram no seu estudo diferenciar as respostas neuronais em contextos cooperativos e competitivos, que são os dois contextos sociais mais importantes na sociedade humana. Os resultados comportamentais indicaram que, na presença de cooperação, os participantes resolveram as tarefas de forma mais precisa e rápida do que na presença de competição. Os resultados sugerem que a cooperação melhora o desempenho das tarefas e ativa respostas neuronais associadas à recompensa e à mentalização.
A cooperação e a competição são os dois comportamentos sociais mais importantes na sociedade humana. Numa perspetiva evolucionista, a cooperação envolve a partilha de recursos para aumentar a segurança do grupo e garantir acesso fiável a recursos importantes. Em contrapartida, a competição envolve a monopolização dos recursos para se maximizar as vantagens individuais com base na sobrevivência do mais apto.
No entanto, tem havido um longo debate sobre a importância relativa destes dois comportamentos sociais:
Adeptos de uma visão humanista defendem que, quando se pretende orientar as pessoas para objetivos comuns e partilhados, a cooperação é mais benéfica para a motivação humana e produtividade. Ao cooperar, os indivíduos podem complementar-se e perceber os benefícios associados na prossecução de um objetivo ou meta partilhada.
Em contrapartida, os behavioristas afirmam que a competição promove produtividade criando uma rivalidade feroz entre os indivíduos. Perante a competição, os indivíduos tendem a maximizar o seu potencial para superar os seus adversários.
Este debate em curso passou agora para questões mais fundamentais tais como e porquê a cooperação e a competição resultam em consequências diferentes apesar das suas características partilhadas a nível da interação social entre seres humanos. Neste paradigma, a cooperação é caracterizada por cooperadores recíprocos, justos e altruístas, enquanto a competição é criada através da introdução de relações não recíprocas, injustas, enganadoras e egoístas:
A cooperação ativa sistemas de recompensa como o córtex pré-frontal ventromedial (vmPFC) e estriado, e regiões de mentalizando como o córtex pré-frontal dorsomedial (dmPFC), junção temporoparietal (TPJ) e sulco temporal superior.
Em contraste, a competição ativa regiões cerebrais relacionadas com a inferência, como o giro frontal inferior (GFI) e o córtex pré-frontal dorsolateral. (dlPFC) e as regiões de mentalização.
Estas descobertas apoiam a visão de que, numa perspetiva evolutiva, os humanos são criaturas cooperativas e altruístas, uma vez que ativam circuitos de recompensa e redes cognitivas sociais adaptativas. No entanto, a competição parece fazer com que os indivíduos se envolvam na leitura e monitorização das intenções dos adversários durante o jogo como meio de reconhecer e antecipar a traição ou engano.
A cooperação e a competição podem levar a respostas neuronais e emocionais distintas relativamente a outras pessoas, como a empatia, uma vez que são inevitavelmente acompanhadas por reações emocionais ou de julgamentos das outras pessoas.
Os estudos que se centraram nas diferentes respostas empáticas relativamente às emoções dos outros, em função do contexto social, mostraram diferenças na resposta emocional relativamente aos outros indivíduos que podem ser compreendidas em relação à natureza da cooperação e competição. A cooperação proporciona aos participantes objetivos partilhados e incentiva-os a encontrar soluções conjuntas. Neste sentido os parceiros ou membros do grupo são considerados como estando do mesmo lado e são vistos como de confiança. Em contrapartida, a concorrência pressupõe que outros indivíduos terão interesses e objetivos opostos ou conflituantes, encorajando assim os participantes a separar ou distinguir-se a si próprios dos outros. Com base no exposto, podemos supor que a cooperação levaria a respostas mais empáticas em relação à dor dos outros, enquanto a competição não.
As diferenças individuais na sensibilidade em relação aos sinais sociais e emocionais externos tendem a modular o efeito social e contextual das respostas cognitivas, emocionais e sociais do cérebro humano, o que por sua vez levaria a mudanças comportamentais subsequentes.
As descobertas demonstraram que indivíduos empáticos mostram ativações cerebrais mais fortes nas redes empáticas e de mentalização quando estão a ajudar outros parceiros em contextos cooperativos. Este tipo de pessoas percebe o contexto cooperativo como sendo consistente com a sua motivação que está mais relacionada para o comportamento pró-social. Portanto, este tipo de indivíduos pode ser mais facilmente imerso numa tarefa num contexto cooperativo do que noutros contextos sociais que geram hostilidade ou competição. Nesse sentido, este tipo de indivíduos podem não ser capazes de se concentrar completamente na tarefa num contexto competitivo porque a tarefa de derrotar ou atrapalhar a outra pessoa num jogo, é percebida como incongruente considerando a sua característica psicológica básica. Consequentemente, é provável que tenham uma ativação mais fraca nas regiões do cérebro relacionadas com o estado de empatia e mentalização quando observam a dor dos outros durante uma competição. Assim, os autores analisaram a interações entre a empatia de traço e empatia de estado em diferenciais contextos sociais.
Os autores concluíram que a cooperação conduz a respostas comportamentais, cognitivas e emocionais mais adaptativas, especialmente para indivíduos altamente empáticos. Num contexto cooperativo com base num objetivo comportamental simples – ajudar outra pessoa sem interação ou feedback recíproco – foi suficiente para provocar respostas comportamentais e neuronais mais desejáveis. Num contexto cooperativo, os participantes tiveram melhor desempenho, sentiram-se mais satisfeitos com o seu comportamento de ajuda e mentalizaram melhor o jogador oposto comparativamente ao contexto competitivo. Além disso, os indivíduos empáticos demonstram mais empatia pela dor do outro num contexto cooperativo do que num contexto competitivo.
Quando alguém é percebido como inimigo (adversário), são utilizados circuitos diferentes. Também, quando se trata alguém como competidor/concorrente, a capacidade para a empatia cai significativamente.
O pedagogo John Hunter quando observa os alunos a jogar o "Jogo da Paz Mundial" que ele desenvolveu, verifica uma mudança na consciência e valores:
A partir de certa altura verifica-se uma mudança quando os alunos se apercebem que têm de estar todos do mesmo lado. Constatam que estão envolvidos num conflito unificador e que, em última instância, têm de trabalhar em conjunto.
Por outras palavras, os alunos tomam consciência que, para se alcançar a paz, a linguagem da oposição não lhes permite alcançar o objetivo do jogo, apenas o conseguem quando passam a usar a linguagem da cooperação.
A Paz (do latim Pax) é geralmente definida como um estado de calma ou tranquilidade, uma ausência de perturbações e agitação. Derivada do latim Pacem = Absentia Belli, pode referir-se à ausência de violência ou guerra, mas não se esgota aí.
O praticante desportivo raramente está num estado de calma e tranquilidade, e são constantes as perturbações e a agitação inerentes ao stresse provocado pelo nível de exigência do treino e competição e da necessidade de vencer o jogo ou a prova. O mesmo acontece com os alunos que participam nos jogos desportivos coletivos na sala de aula. São recorrentes as tensões, os atritos e desentendimentos durante o jogo, alguns amuam e desistem, outros manifestam agressividade verbal.
Como vimos, o desporto é uma substituição mimética do tipo de confronto que a guerra significa, substituindo a sua forma mais violenta por uma violência controlada e diminuída. O desporto vive da polarização e não cumpre os requisitos e pressupostos para ser considerado uma atividade promotora de paz quando a confrontamos com a definição. O modelo da "Roda da Destruição" de Pierre Weil mostra claramente que a competição e as lutas de poder estão na base da desagregação da vida social e política. Manuel Sérgio reconhece no seu livro Desporto é dizer Transcendência, que todos os desportos são por natureza competitivos e, por isso, possibilitam a emergência da agressão.

Pierre Weil "Roda da Paz" - A Mudança de Sentido e o Sentido da Mudança.
O Desporto, e a competição que o alicerça, personificam uma linguagem belicista. Se queremos ensinar a Arte de viver em paz consigo, a Arte de viver em paz com os outros e a Arte de viver em paz com a natureza, temos que alterar aquilo que consideramos essencial aprender através da Motricidade Humana cujo objetivo é Transcender este modelo social disfuncional e polarizado, transcender a nossa necessidade de nos compararmos com os outros e tentar superá-los, porque todos nós, todos os Seres Humanos estão envolvidos num Conflito Unificador, num jogo infinito que apenas se vence pela Cooperação Planetária.
Transcender Manuel Sérgio
Todos nós devemos honrar e reconhecer o contributo dos nossos Professores e Manuel Sérgio é sem dúvida um deles. Porém, também devemos Transcende-los e enriquecer o diálogo com a nossa experiência, criatividade e sabedoria prática. Transcender com algo que valorize os seus ensinamentos mas que os agilize, potencie, otimize e simplifique. Se me perguntarem se me identifico com tudo o que ele escreveu, responderei que não, porque aprendi a pensar por mim próprio e a não ficar refém das verdades dos outros, mas a construir a minha própria verdade, a escutar o "meu Mestre Interior de Verdade!".
E porque Manuel Sérgio abriu o caminho à Transcendência quebrando um tabu e o preconceito da Educação Física que receia que a espiritualidade comprometa a cientificidade, permito-me citar Olivier Reboul, num livro que li atentamente no tempo de faculdade e se intitula "O que é aprender?". O autor refere, em determinada altura, que "o homem não pode ensinar ao homem, só o verbo divino é que o pode fazer". "Que pai, pergunta Agostinho, seria bastante tolo para mandar o filho para a escola com o simples intuito de saber o que pensa o mestre?". "Se o aluno vai para a escola, não é portanto para conhecer as opiniões de tal ou tal professor, mas sim para conhecer a verdade. Ora, é a iluminação que lhe ensina a verdade; é ela que lhe permite aprender, quer dizer compreender se o que diz o mestre humano é verdadeiro ou falso, saber não o que pensa determinado homem mas sim o que se deve pensar enquanto homem". "O professor expõe, não o seu pensamento mas a sua disciplina: Educação Física/Motricidade Humana. Depois os alunos examinam por si mesmos se aquilo que lhes transmitiram é verdadeiro e contemplam assim, na medida das suas forças, a verdade interior. É então que se instruem". "A ideia de que existem mestres é portanto ilusória, visto que aqueles que assim são designados não são ensinantes (doctores) mas ensinados (doctos); da mesma forma que os seus alunos aprendem do Mestre Interior de Verdade". "Ensinar reduz-se por conseguinte em fazer aprender; e aprender consiste em se lembrar seja do sensível seja do inteligível. Neste último caso, não se trata de uma recordação do passado mas do presente, de um despertar da alma para a luz divina. A alma é o olho, e Deus é a Luz". "O professor é, como o seu aluno, um aluno, instruído pelo mestre de verdade que está nele. Qualquer que seja o objeto da sua ciência, todos os homens se encontram na mesma escola, condiscípulos de um único e mesmo mestre". "O mestre não transmite a verdade; a sua tarefa própria é admonere, recomendar ao aluno consultar o Mestre Interior, levá-lo a se lembrar da verdade que está nele". "O mestre humano não é portanto aquele que ensina, mas aquele que interroga; o seu discurso não mais é que questionamento progressivo, que incita o aluno a procurar a resposta na luz do espírito, além de qualquer linguagem humana". "É então que o mestre humano desempenha o seu verdadeiro papel; fazendo ao aluno perguntas apropriadas ao seu nível, obrigando-o a tomar progressivamente consciência da verdade que existe nele". "A única superioridade do mestre reside no seu método. Nenhum mestre pode transmitir nem a experiência nem a inteligência seja do que for, pois se o aluno compreende, é porque o mestre não faz mais do que despertar nele o que já sabia". "Por outro lado, enquanto monitor, o mestre humano é aquele que motiva o aluno para aprender, mas a verdadeira motivação é o prazer que se sente em compreender, nesta luz interior da verdade que inunda aquele a quem chamamos o homem interior de clareza e fruição".
A única diferença entre o aluno e o mestre é o método porque tanto o aluno como o mestre são condiscípulos de um único e mesmo mestre, o mestre interior de verdade, o homem interior de clareza e de fruição, qualquer que seja o objeto da sua ciência!
Olivier Reboul Cita Santo Agostinho.
Se queremos Transcender a Educação Física teremos que transcender a nossa fixação no Desporto e na competição.
Michel Lobrot no seu livro "Os efeitos da Educação" diz que à partida uma crença é apenas uma ideia que, embora não sendo absolutamente fundada, não é abandonada nem repelida, adquirindo, pelo contrário, uma realidade, pelo facto de inspirar a ação e estabelecer objetivos ao indivíduo. A crença existe devido a um desacerto entre o pensamento que, por definição, só se satisfaz com evidências, e a ação que, por não poder esperar indefinidamente que tudo se clarifique, exige execução imediata. A crença, apoia-se em probabilidades, ainda que fracas, em hipóteses, ainda que gratuitas, em puras possibilidades. Tudo isto pode apaziguar o indivíduo, se este recusar, por razões afetivas, submeter as suas crenças à crítica, na esperança de lhes conservar toda a força de probabilidade. Todas as "ideias" que não passam de hipóteses, tornam-se crenças a partir do momento em que se lhes inflige um duplo tratamento:
Em primeiro lugar, recusa-se pô-las em dúvida, considerando-se uma heresia ou pecado qualquer dúvida a seu respeito.
Em segundo lugar trabalha-se desesperadamente na esperança de alcançar o estado de coisas em que se acredita, praticando-se esforços gigantestos e sacrifícios heroicos para as justificar e defender.
Estamos no coração do paradoxo humano. Como pode um ser, que possui Inteligência e uma capacidade infinita de aprender, recusar o saber e a procura, ao encontrar uma teoria que o satisfaça? Como pode ele alimentar sentimentos que negam a sua criatividade fundamental (...), afirma Michel Lobrot no seu livro os efeitos da educação.
A Ciência da Motricidade Humana (CMH) supõe uma reforma do pensamento, uma reforma do ensino, novos currículos nos cursos superiores de educação física e desporto.
Manuel Sérgio, Desporto é Dizer Transcendência.
O Próximo grande salto evolutivo da humanidade será a descoberta de que cooperar é melhor que competir.
Pietro Ubaldi
Numa Sociedade onde todos ajudam o próximo, todos prosperam juntos.
Autor desconhecido
Os cursos de formação propostos na rede-Motricidade-Humana refletem o resultado desta procura de Novos Valores e da Transcendência da atual ideologia da EF. Na sua génese esteve o questionamento, a experiência prática, a investigação e formação complementar inspirados também por Manuel Sérgio que incitou ao questionamento e auto-descoberta.


Assim como existem muitos alunos que não se identificam com este modelo de EF, o mesmo acontece com alguns Professores. Este projeto pretende contribuir para uma Nova Visão da EF, mais democrática, mais eclética, mais humanista, mais inclusiva e de maior qualidade.

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